O Dia Mundial de Conscientização sobre a Doença Celíaca é comemorado no dia 16 de maio. A intolerância ao glúten, ou doença celíaca, é uma condição autoimune em que o sistema imunológico reage ao glúten, proteína presente no trigo, no centeio e na cevada. Pensando na alimentação das cerca de 2 milhões de pessoas no Brasil que são afetadas pela condição, segundo a Associação dos Celíacos do Brasil (Acelbra), diversos estabelecimentos em Santa Catarina produzem alimentos e pratos livres de glúten.
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Segundo Kamilly Viana Beretta, de 37 anos, e dona da Levain Cozinha Inclusiva, a ideia de estabelecimentos que sigam a linha de produção sem glúten é buscar atender aos celíacos que desejam comer pastéis, bolos e outros doces e salgados que acabam saindo do cardápio após o diagnóstico.
De acordo com o Ministério da Saúde, o consumo de glúten em um portador de doença celíaca pode causar inchaço na barriga, danos à parede intestinal, dor abdominal, osteoporose, perda de peso e desnutrição, anemia e outros.
Os sintomas da doença, em geral, aparecem entre os seis meses e dois anos e meio de vida, segundo o Ministério. No entanto, isso não é regra.
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Nathália Possato Ceolin, de 32 anos, atual dona da Paní — Vida Sem Glúten, e celíaca, relata que é “bem complicado” comer fora, devido ao pequeno número de cozinhas descontaminadas de glúten em estabelecimentos. Segundo Ceolin, é difícil encontrar restaurantes que indiquem que um alimento possui ou não glúten.
— Não é fácil, eu quase nunca como fora, por esse medo. Isso é uma coisa que ainda não é tão conhecida. O glúten tá escondido em coisas que, às vezes, a gente nem imagina. Num chocolate, num ketchup, numa maionese, em coisas que você fala: “não acredito que isso tinha glúten”. O polvilho, por exemplo, é feito de mandioca, mas não é só mandioca, tem a questão da contaminação dos alimentos usados, que é algo muito grave para a gente — relata Nathália.
O gastroenterologista Nelson Cathcart Jr., diagnosticado aos 36 anos com a doença celíaca, destaca que viver sem glúten exigiu adaptações significativas na rotina, mas que, hoje em dia, é muito mais viável por iniciativas como a Lei Federal nº 10.674 de 2003, que obriga a identificação de glúten nos rótulos de alimentos industrializados, para resguardar o direito à saúde dos portadores de doença celíaca.
Cathcart Jr. salienta que, apesar dos avanços, a convivência com a doença ainda apresenta desafios sociais.
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— Às vezes você tem que ir a algum evento e fazer a refeição antes mesmo de ir para algum restaurante, pois não se sabe se lá terá alguma comida preparada adequadamente. Pois, se eles forem preparados no mesmo ambiente onde são manuseados alimentos com trigo, sejam pratos, panelas e talheres, isso pode gerar uma contaminação nociva, causando danos ao intestino de quem tem a doença — compartilha o médico.
Mulheres lideram os estabelecimentos livres de glúten
Em Lages, na Serra catarinense, Bruna Camargo Alves, de 33 anos, comanda a Sabores Irresistíveis, ao lado do companheiro Guilherme Branco, de 41 anos e portador da doença celíaca.
Bruna conta que começou o negócio na pandemia, quando ela tomou iniciativa de fazer bolos sem glúten para vender e construir uma renda para a família. Na época, Guilherme trabalhava e ela ficava em casa com a filha que, em 2020, tinha 5 anos. Da pandemia até 2025, a Sabores Irresistíveis funciona totalmente por delivery e retirada, sem espaço físico.
Bruna relata que soube da doença quando conheceu Guilherme, há 12 anos, que foi diagnosticado quando completou um ano de idade. Ela ainda conta que não sabia cozinhar nada e, devido à alimentação mais restrita do companheiro, aprendeu receitas que pudessem ser gostosas e saudáveis.
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— Quando a gente começou a vender, eu não imaginava que tinha tantas pessoas celíacas. Começamos a oferecer um cardápio em grupos e as pessoas pedem. Um começou a falar para o outro e assim a gente foi montando o negócio — relata Bruna.
Segundo Bruna, a importância de estabelecimentos livres de glúten é justamente a inserção dessas pessoas em ambientes onde eles possam comer alimentos como qualquer um. Ela menciona os lugares que são aptos para pessoas celíacas em Lages, como a Hamgourmet, hamburgueria que oferece um cardápio livre de glútens, aprovado pelo comitê de celíacos da Serra, para os que portam a doença.
Os donos da Sabores Irresistíveis fazem parte da Associação de Celíacos da Serra Catarinense (ACELSerra), assim como Kamilly Viana Beretta, que é dona da Levain Cozinha Inclusiva.
Mulheres apostam em negócios voltados a intolerantes ao glúten
Bruna Alves comanda a Sabores Irresistíveis com Guilherme Branco, portador da doença celíaca (Foto: Sabores Irresistíveis, Divulgação)

Donos da Sabores Irresistíveis fazem parte da Associação de Celíacos da Serra Catarinense (Foto: Sabores Irresistíveis, Divulgação)

Em Florianópolis, Nathália Possato Ceolin apostou na Paní, que oferece comida gostosa sem glúten (Foto: Paní, Divulgação)
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Mercado fez agrônoma entrar no ramo da gastronomia
Diferente de Bruna e Guilherme, Kamilly não é, nem tem ninguém na família, que seja portador da doença celíaca. Agrônoma de formação, ela conta que começou a planejar essa transição para o mundo da gastronomia em 2023, a partir de uma observação sobre o mercado.
Segundo Kamilly, a principal preocupação, que surgiu na criação do estabelecimento, foi a possibilidade de oferecer alimentos livres de glúten a crianças que têm dieta restrita devido à doença.
— Me aprofundei e estudei bastante para abrir a Levain. É abraço de causa. Tem pais que chegam chorando porque as crianças finalmente vão ter oportunidade de experimentar algum doce. É a coisa mais linda de ver. Fazemos café colonial, e já chegou gente chorando que nunca tinha imaginado uma coisa tão grande assim, sabe? O último relato que a gente teve, uma cliente nossa, que sempre tá por aqui, me chamou no cantinho e me olhou no fundo do olho e disse: “Kamilly essa bolacha de Natal tem o gosto da bolacha que minha avó fazia”, e ela começou a chorar — relata Kamilly.
Kamilly explica que hoje em dia a maior dificuldade, na perspectiva dela, é levar essa comida acessível para as escolas e crianças carentes, podendo oferecer a todos a oportunidade de comer alimentos descontaminados. Segundo a dona da Levain, em conversa com a nutricionista da Prefeitura de Lages, a comunidade tentou abordar e entrar com um projeto alimentação segura nas escolas, mas, devido à falta de diagnóstico, a nutricionista disse que é difícil fazer essa implementação nos cardápios.
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Comida gostosa e sem glúten
Em Florianópolis, Nathália Possato Ceolin, natural do Mato Grosso do Sul, que é a atual dona da Paní — Vida Sem Glúten e portadora da doença, começou um negócio antes de assumir o estabelecimento. Nathália, que recebeu o diagnóstico há 15 anos, antes era dona do Menu da Nath, onde vendia alguns alimentos livres de glúten.
Ela começou os negócios após incentivo dos amigos, quando ela fez um brownie que, segundo os amigos, “era melhor que os normais”. Ela assumiu a Paní este ano, após as donas do negócio, Cláudia e Milena, fundadoras, decidirem vender o estabelecimento.
Nathália relata que o principal objetivo agora é conseguir servir um bolo gostoso, como os de festa, pastel e coxinhas, podendo proporcionar um cardápio acessível a todos os visitantes do local.
— Às vezes as pessoas confundem e falam: “ah, mas eu queria algo sem açúcar, fit, saudável, baixo nisso e baixo naquilo”. Não, não é o nosso objetivo. O nosso objetivo é ser gostoso mesmo, é suprir aquela necessidade do glúten. A minha família, no começo, não queria nem provar as coisas sem glúten, porque eles falavam: “não, é tudo ruim, é tudo duro” e eu falei: “não, esse aí que você comeu, a pessoa não sabia fazer” — explica Nathália.
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Mulheres no comando
O cenário das lideranças dentro de estabelecimentos que oferecem alimentos livres de glúten é majoritariamente formado por mulheres. A trajetória de Bruna, Kamilly e Nathália reflete o crescimento do empreendedorismo feminino no Brasil. Segundo o Global Entrepreneurship Monitor (GEM), as mulheres já representam cerca de 50% dos novos negócios no país.
Além da Paní, da Sabores Irresistíveis e da Levain, há em Santa Catarina diversos estabelecimentos que oferecem cozinhas descontaminadas e alimentos sem glúten. Isso porque, no Estado, dados indicam uma elevada prevalência de doença celíaca.
Entre 2010 e 2020, cerca de 32% dos pedidos de exames de anticorpo antitransglutaminase IgA da região Sul do Brasil foram feitos em Santa Catarina. Estima-se que 27% dos associados da Associação dos Celíacos do Brasil: regional de Santa Catarina (Acelbra-SC) relataram presença de familiares com doença celíaca.
A estimativa é que 1% da população mundial seja portadora da doença celíaca. De acordo com uma revisão sistemática e meta-análise publicada em 2018 pela Fenacelbra, a doença celíaca é um problema de saúde pública global. Os seguintes dados são apontados:
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- A prevalência global dessa condição é de 1,4% com base em achados sorológicos e 0,7% com base em achados de biópsia (soroprevalência de 1,4% e prevalência de 0,7%)
- A prevalência global de DC varia com sexo, idade, e localização geográfica.
- A prevalência global de DC tem aumentado ao longo do tempo, passando de 0,6% entre 1991 a 2000 para 0,8% entre 2001 e 2016.
- Há uma necessidade de estudos de prevalência de base populacional em muitos países para estimar a presença global da DC corretamente.
Maio Verde dá visibilidade à doença celíaca
Para conscientizar a população e promover diagnósticos precoces, o mês de maio é marcado pela campanha Maio Verde. O gastroenterologista, Nelson Cathcart Jr., enfatiza a importância da conscientização para que sintomas crônicos não sejam ignorados e que o diagnóstico seja correto, uma vez que outras doenças relacionadas ao trigo, como sensibilidade e alergia, podem gerar sintomas semelhantes aos do aparelho digestivo.
O especialista em doenças do estômago e intestino explica que, embora não exista cura, o diagnóstico precoce é fundamental para controlar os impactos da doença.
— Exames de sangue e biópsias realizadas durante endoscopias digestivas ajudam a identificar inflamações e atrofias no intestino causadas pela ingestão de alimentos com glúten — completa o médico.
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*Sob supervisão de Andréa da Luz
Antonietas
Antonietas é um movimento da NSC que tem como objetivo dar visibilidade a força da mulher catarinense, independente da área de atuação, por meio de conteúdos multiplataforma, em todos os veículos do grupo. Saiba mais acessando o link.

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